Ravióli?

Era a primeira viagem para o exterior. Passaporte, malas, guias, treino do idioma…Tudo planejado como se fosse o casamento da rainha da Inglaterra, mas com um orçamento que beirava a vida de um Oliver Twist. O destino? Londres e seu cenário cosmopolita.

Saltavam dúvidas, anotações, ideias e ansiedade. Pensamentos que se ampliavam na hora de dormir. “Vou conseguir um bom assento no avião? Deveria comprar ingressos antecipados? O câmbio vai mudar muito? Vai chover?” 

Havia pouco tempo para planejar um desafio de tal envergadura. As férias só vieram em dezembro, uma exigência da chefia. Talvez a corporação ignorasse o humor inglês, mas prezasse por horários e pontualidade nas folgas dos colaboradores. O patrão estava concentrado nas metas da empresa. Para ele pouco importava o preço das passagens, frio ou qualquer outro item que justificasse uma escolha. Ficou tudo para o fim do ano. 

Ravióli?

No tão esperado dia lá se foi o Boeing 777, da British Airlines. Após quase 11h30, avistava-se o tão sonhado solo britânico, traduzido pela imponência do aeroporto de Heathrow. Na chegada o passaporte foi carimbado com gentileza pela funcionária local. A caminho do hotel havia uma mistura de sentimentos e ansiedade. E como estava difícil entender o que eles falavam! As semanais aulas de inglês se dissolviam no frio. As palavras fugiam e se escondiam em vários tons do cinza londrino.

Arriscar e aprender com o desconhecido, entre erros, acertos e sabores.

Marcelo Balbino

A admiração inicial foi batizada com muita chuva e a melhor programação foi almoçar no próprio restaurante do hotel. Sobrou uma mesa escondida atrás de um pilar, ao fundo do pequeno e movimentado salão. Após alguns minutos, um garçom que parecia ser indiano se aproximou e perguntou: 

– Ravióli?

A resposta veio no susto, seguida de vários pensamentos:

No, I would like local food. Seria um festival gastronômico italiano? Uma cortesia do hotel? Ou uma prova da globalização: um garçom indiano, que oferecia – no idioma inglês -, uma comida italiana, em pleno reino britânico?

Após muitas risadas o garçom falou novamente, de forma pausada:

Ready…to…order?

Ufa! Agora sim a ficha havia caído. Era apenas para fazer o pedido! Um pequeno lapso entre interlocutores. E assim começou o breve aprendizado da cultura estrangeira. As coisas foram sendo colocadas em seus lugares e também no prato. Suspenderam o “ravióli” e trouxeram fish and chips

Chanceler britânico Rishi Sunak servindo pratos em Londres.

Primeiro dia com emoção. Olhar para fora pode sinalizar os caminhos de uma transformação interior. Era preciso estudar mais o idioma inglês, mesmo sendo fã de ravióli. De qualquer forma viajar é sempre uma travessia. Arriscar e aprender com o desconhecido, entre erros, acertos e sabores. Quem provou que o diga. Primeiro carimbo no passaporte, mas sempre gravado na memória. 

Marcelo Balbino*

* Marcelo Balbino é jornalista, pós-graduado em Português – Língua e Literatura e mestre em Comunicação, Arte e Cultura.

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